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União Brasileira de Trovadores
Seção São Paulo - SP
"A Trova, acima de tudo, faz amigos!" (Izo Goldman)
Fernando Costa por Domitilla Beltrame
Um garimpeiro da Trova
Ser velho - não tendo idade -
sempre somos, quando somos,
o abrigo de uma saudade
do menino que nós fomos!
O Trovador que lembramos, foi associado e membro de diretoria da UBT- Seção São Paulo.
Nasceu em 14 de dezembro de 1921, na cidade do Porto em Portugal; veio para o Brasil em 1961 e se fixou em São Paulo.
Em Portugal, formou-se em técnico de contabilidade, foi professor por algum tempo na escola onde se formou, mas nunca exerceu a profissão. Foi atleta do Ginásio Balter do Porto, delegado do Atlético e do Luta e dirigente do Boa Vista Futebol Clube, do qual era fanático torcedor, e, mais tarde representante deste clube aqui em São Paulo.
No Brasil, foi diretor e conselheiro da Portuguesa de Desportos e diretor cultural do Arouca São Paulo Clube. Como se vê, bem ligado ao esporte. Foi membro da Mesa Administrativa da Casa de Portugal onde garças a ele a Seção São Paulo, fez suas reuniões por muito tempo.
Gostava também de política e escreveu muitos trabalhos que foram publicados nos jornais “Portugal em Foco” e “ Mundo Português”, ambos do Rio de Janeiro.
Nunca se desligou completamente de seu país, como escreveu nestas Trovas:
Se é lusa a nossa raiz
ou lusitana a semente
sente-se ao longo o país
a viver dentro da gente!
No rosário da humildade
de um português imigrante
cada conta é uma saudade
rezada à pátria distante!
Foi, na opinião da colônia portuguesa, um baluarte na defesa de tudo que se relacionava com Portugal e os portugueses.
Frequentava a reuniões da UBT, quase sempre ao lado de sua esposa D. Eunice e nas rodas de Trovas, dizia Trovas assim:
Entendo a fraternidade
quando existe a divisão
de cada irmão ser metade
na metade de outro irmão!
Faz tempo o seu descarte
num jogo tão conduntente
que na vida de quem parte
vai sempre parte da gente!
Foi premiado em muitos concursos nacionais e em todos os Concursos da Drogazeta com Trovas como estas:
Alegre como um menino,
ou capaz de entristecer,
meu coração – velho sino –
tem dois jeitos de bater...
Para uma exposição do pinto Mário Beltrame, ilustrando uma pirogravura de uma velha costurando, colocou esta beleza de Trova:
Quando o olhar da avó mergulha
na roupa rota do neto,
a caminhada da agulha
segue destinos de afeto...
Em 1980, sob o patrocínio do Consulado Geral de Portugal, através do programa radiofônico “Portugal Nosso Mundo”, coordenou um concurso de Trovas com o tema “Comunidade” e em 1981, com os temas “Camões” e “Portugal”. A entrega de prêmios deste segundo concurso foi feita no Salão Nobre da Casa de Portugal e, pela primeira vez talvez única em entrega de troféus de concursos de Trovas, as Trovas vencedoras foram cantadas pelos fadistas Glória de Lourdes e Mário Rocha, acompanhados por guitarra portuguesa e viola.
Em 1983 lançou o livro “ Versejar é Preciso! ” com poesias e Trovas. Estes trabalhos ele lia em seus programas de rádio “Portugal Trilha Nova”, “Samba e Fado” e principalmente no programa “Portugal Nosso Mundo” que durante muitos anos produziu e apresentou em emissoras como Rádio Marconi, Rádio Emissora ABC de Santo André, Rádio São Paulo e Rádio Gazeta. Nessas rádios ele divulgava trovas assim:
Na vida, o mais triste exílio,
se forma pela distância,
quando um velho pede auxílio
às memórias de uma infância!...
Cada grão que o lavrador
lança à terra, em gesto amigo,
é uma pergunta de amor
que quer respostas de trigo!
A mão que de longe acena
num adeus em despedida,
quando mais fica pequena
mais se agarra à nossa vida!
Meu Deus, que ternura encerra
em seu rumo o passarinho:
Abre as asas... cobre a terra...
Fecha as asas... cobre o ninho!
Em 1998 foi acometido por um derrame que lhe trouxe graves complicações, deixando-o preso a uma cadeira de rodas, com falta de uma perna e ainda privado da falta de uma perna e ainda privado da fala com que durante quase trinta anos animou os corações lusitanos e de quantos ouviam seus programas. Nunca mais recuperou a voz. Mas nós continuamos sendo a sua voz quando dizemos suas Trovas, porque ele mesmo escreveu:
Minha alegria é tamanha,
e a Vida quadra feliz,
se eu escuto boca estranha
cantar as Trovas que eu fiz!...
Na luta para vencer,
o melhor que conquistamos
é a vitória de perder
os defeitos que ganhamos!
Ser velho - não tendo idade -
sempre somos, quando somos,
o abrigo de uma saudade
do menino que nós fomos!
Se de escrever não te fartas,
que importa acento ou sinal?
Quero até que tuas cartas
não tenham ponto final...
Em casa conta do Terço
há um mundo de poesia
quando à noite, ao pé do berço,
a mãe reza; Ave Maria!...
A Vida solta as amarras
e a gente, barco à deriva,
tem de vencer muitas barras
se quiser manter-se viva.
Deu-me a Vida como prova,
nas engelhas do meu rosto,
que o Tempo de lua-nova
passou a ser de sol-posto...
Depois de atirar em dois,
alguém lhe diz: Dá no pé...
E no seu pé, ora pois,
atirou de novo o Zé...
Tão gamada era em Balzac
a "sem-vergonha" da Ana
que estava noiva de Isac
e casou... bla-za-que-a-ana!
Peço ao santo numa prece
"pão nosso de cada dia"...
E o santo só favorece
quando eu vou à padaria...
Faz o tempo o seu descarte
num jogo tão contundente
que na vida de quem parte
vai sempre parte da gente...
Contradição desmedida
é viver sempre a esperança
de ser homem, nesta vida,
sem deixar de ser criança!
A sombra é tão importante
que, conforme a posição,
faz de um anão um gigante
e de um gigante... um anão!